quinta-feira, 3 de julho de 2008

Diesel: a versão da Petrobras

Ontem a Petrobras divulgou seu relatório social e ambiental de 2007. Foram R$ 534 milhões investidos em atividades sociais, esportivas e culturais ao longo do ano passado. Se somados os projetos de meio-ambiente, esse valor sobe para R$ 585 milhões.

Constava também do relatório social, o que é louvável, os questionamentos de setores da sociedade sobre o teor de enxofre do diesel produzido pela estatal. Em abril deste ano, uma ação movida no Conar pela Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo e por organizações como o Movimento Nossa São Paulo e Akatu, entre outros, levou à suspensão de dois anúncios que vinculavam a empresa à questão ambiental. A alegação era de que, com base no que seria uma demora excessiva da Petrobras em reduzir o teor de enxofre de seu diesel, ela não poderia usar esse marketing "ambiental".

O gerente de Responsabilidade Social da Petrobras, Luís Fernando Nery, gastou boa parte do tempo dedicado às entrevistas para falar sobre o assunto. Em sua opinião, o debate sobre o teor de enxofre no diesel tomou uma dimensão emocional, que não condiz com a complexidade do tema.

Sobre a demora da Petrobras em iniciar as pesquisas e a produção de diesel mais leve (com menor teor de enxofre), ele lembrou que a regulamentação da Agência Nacional do Petróleo (ANP) do que seria a composição desse diesel(50 ppm) só saiu em outubro do ano passado. "Ninguém vai fabricar um medicamento ou montar uma fábrica para produzí-lo se não conhece sequer as especificações do produto, isso seria temerário do ponto de vista empresarial", explicou Nery. Foi por conta desse atraso na regulamentação, segundo ele, que a Petrobras só pode começar as unidades de tratamento para redução do teor de enxofre do diesel no final do ano passado.

Além disso, Nery defende que houve um grande equívoco sobre o fato de que o Conama teria decidido uma redução do teor de enxofre do diesel produzido pela Petrobras. O que o órgão que traça diretrizes para o meio-ambiente fez, segundo ele, foi determinar limites de "emissões" para determinados produtos. O que, no caso do diesel, não depende apenas da redução do teor de enxofre, mas também do motor do veículo e de sua regulagem, bem como da qualidade do combustível (sujeito a alterações) e da velocidade média no tráfego.

"Não há nada na resolução do Conama que estabeleça parâmetros de enxofre para o diesel, até porque não cabe a ele fazer isso. Dizer que o problema da emissão em São Paulo é só por causa do diesel é vilanizar o produto, é colocar uma visão simplista para um problema complexo", disse o executivo, acrescentando que, segundo pesquisas, um quarto da frota de veículos a diesel em São Paulo está desregulada, representando 80% da emissão.

De nada adiantará a redução do enxofre (de 2000 ppm para 50 ppm), acrescentou Nery, se o trânsito da capital paulista continuar travado como está - e piorando. Questinou, nesse sentido, porque a Secretaria do Meio Ambiente não antecipou a inspeção veicular (que começou este ano) em São Paulo, como fizeram outros estados. "É fácil atirar pedra nos outros. Essa questão tomou uma dimensão completamente emocional", criticou o gerente da Petrobras, atribuindo - sem citar nomes - motivações de diversas ordens para a ação no Conar, inclusive as de ordem "nitidamente políticas e de curtíssimo prazo".

Chegou até a citar o Ministério da Verdade, do livro 1984, de George Orwell, que transformava mentiras em verdades absolutas aos olhos da população. "O site do Movimento Nossa São Paulo coloca a decisão do Conar como uma decisão histórica, em que dois anúncios foram suspensos. Só que não falam que eram três anúncios, que um deles teve sua suspensão revogada e que os outros dois ainda sequer foram julgados, apesar da suspensão."

A Petrobras promete entregar o diesel de 50 ppm na capital paulista até janeiro deste ano, para os veículos com determinada motorização.

Não importa quem esteja com a razão, toda essa discussão traz um ensinamento importante: as empresas que adotam o tema socioambiental como parte de sua estratégia de negócios e de marketing serão cada vez mais cobradas a atuarem em linha com tais princípios. E quanto maior o apelo, maior o telhado de vidro.